Artigo: A divisão do Pará e a capacidade de realizar políticas públicas
Por Eduardo José Monteiro da Costa (*)
December de 2011
A cada dia que passa vem aumentando o interesse da sociedade paraense pelo o tema da divisão do estado do Pará. No meio deste processo, contudo, ainda imperam a desinformação e alguns mitos. Uma análise precipitada, sem se deter profundamente nos dados econômicos projetados, leva o cidadão a acreditar que a divisão do estado será positiva na medida em que diminuirá a extensão dos estados e gerará, ao menos na teoria, uma maior proximidade com a população. A pergunta central deste debate, portanto, é se a divisão do estado do Pará aumentará a capacidade de intervenção do Estado, partilhada em três novas estruturas burocrático-administrativas.
Alguns comentários postados no meu blog por cidadãos do interior e até mesmo de Belém defendem a divisão do estado na medida em que esta trará, para os seus autores, melhoria nos serviços públicos prestados. Esta opinião, contudo, não se sustenta a uma análise criteriosa dos dados.
A capacidade de realização de políticas públicas perpassa fundamentalmente pela capacidade de investimento do Estado. E esta informação precisa ser mais bem qualificada para a população em geral. O orçamento do Estado divide-se em custeio e investimento. O primeiro é o gasto com a manutenção do aparelho estatal, pagamento de salários, compra de material de expediente, gasolina, pagamento de luz e telefone, por exemplo. O segundo, o investimento, mede efetivamente a capacidade que o estado tem para construir novos hospitais, escolas, pavimentar estradas, melhorar o saneamento básico, comprar equipamentos para a polícia, para os hospitais e as escolas, dentre outros. Portanto, em termos de serviços públicos prestados a população, é este segundo tipo de gasto que interessa. Desta forma, quanto maior o gasto com custeio da máquina pública, menos recursos o governo dispõe efetivamente para prestar um bom serviço ao cidadão. Este é o ponto central a ser debatido.
O economista Rogério Boueri do IPEA estimou alguns dados sobre o custeio dos novos estados, que nos levam a refletir melhor sobre qual será a capacidade efetiva de investimento dos novos estados. Ou seja, qual será realmente a capacidade que estes estados terão para atender as reais demandas dos seus cidadãos?
No texto para discussão de número 1.367 do IPEA, “Custo de Funcionamento das Unidades Federativas Brasileiras e suas Implicações sobe a Criação de Novos Estados”, Boueri procedeu à estimativa dos gastos públicos dos novos estados utilizando-se de projeções baseadas no contingente populacional, dos PIBs, das áreas e dos números de municípios de cada novo estado. O estudo do economista projeta que os novos estados terão um elevado gasto com custeio de suas máquinas públicas. Hoje o estado do Pará, do ponto de vista federativo, é considerado um estado ineficiente. Enquanto a média nacional de gasto percentual do PIB com custeio é de 12%, o estado do Pará gasta 16% do seu PIB com custeio da máquina burocrático-administrativa. Havendo a divisão o Pará remanescente subirá o seu custeio para 19% do PIB, Carajás terá um custeio estimado de 23% do PIB e Tapajós de 51% do PIB.
O estado de Carajás, de acordo com estimativas do economista, gastará R$ 2,9 bilhões por ano com a manutenção da máquina burocrático-administrativa e Tapajós R$ 2,3 bilhões. Ambos os estado serão deficitários da ordem de R$ 2,16 bilhões. Ou seja, precisarão de complemento de recursos da União para o equilíbrio de suas contas públicas. Mais de R$ 7 bilhões deixarão de ser investidos em serviços públicos aos cidadãos para serem destinados à sustentação das novas máquinas públicas. É neste ponto que o economista afirma: “Um forte argumento, a meu ver, contra a criação desses estados é a insustentabilidade financeira de ambos”.
Rogério Boueri em outro artigo “Será a divisão do estado do Pará uma boa idéia?” vai mais além ao afirmar: “No entanto, podem existir razões menos nobres, de maior ou menor legitimidade por trás das proposições de criação destes estados. Dentre elas a criação de inúmeros novos cargos eletivos e de confiança que permitiriam uma diluição da concorrência política por posições públicas (...) O domínio político de áreas potencialmente geradoras de tributos também pode ser uma das razões motivadoras dessas proposições. A região que formaria o Estado do Carajás é rica em minerais e já conta com uma grande operação da Vale. A usina de Belo Monte, a ser construída nos próximos anos, será localizada em Vitória do Xingu, município que integraria o estado do Tapajós. Dificilmente o orçamento monumental dessa operação terá passado despercebido.”
Esta discussão é fundamental na medida em que o IBGE estima que até 2014 o estado do Pará deva receber em torno de 400 mil migrantes em busca de novas oportunidades. Esta leva demográfica causará uma sobrecarga nos serviços públicos e exigirá maior capacidade de resposta do estado, ou seja, mais capacidade de investimento.
Não tenho dúvida de que as dores de quem moram no interior do estado do Pará são justas. Falta realmente a mão presente do Estado. As carências são inúmeras. Contudo, ao contrário do que o senso comum diz, não será com a divisão que os mesmos terão as suas necessidades atendidas. Ou seja, o diagnóstico é preciso, mas a solução equivocada.
A alternativa não é a divisão, mas sim um choque de gestão capaz de promover o aumento da eficácia, da efetividade e da eficiência das políticas públicas, a mudança no paradigma de gestão setorializada para territorializada, a integração das regiões do estado do Pará sob a lógica de um projeto estratégico de desenvolvimento de nosso estado e a mudança radical de nosso modelo de desenvolvimento. Assim, não precisamos nem de mais cargos públicos e nem de mais cargos políticos. Precisamos de um serviço público de melhor qualidade e de melhores quadros em nossa política.
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(*) Economista paraense, doutor em economia aplicada (Unicamp), professor adjunto da UFPA e presidente do Conselho Regional de Economia do Pará. Blog: http://eduardojmcosta.blogspot.com
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