Dinalva Heloiza
Maria Ester de Souza é, sem dúvida, um dos grandes nomes de especialistas em políticas públicas em cenário goiano. Com uma sólida formação acadêmica e uma carreira dedicada ao desenvolvimento urbano e ambiental, ela se destaca como professora na Escola Politécnica de Artes da PUC-GO, além de doutora em Geografia Urbana pela UFG. Sua expertise vai além da academia - Maria Ester também é arquiteta e urbanista, atuando na elaboração de projetos de arquitetura, paisagismo e planos urbanos, incluindo planos diretores e consultoria para legislação urbanística.
Ativa no terceiro setor, ela
contribui de forma significativa para a preservação ambiental como militante na
ONG ARCA – Associação para Recuperação e Conservação do Ambiente. No campo
político, Maria Ester foi uma peça-chave nas duas gestões do prefeito Maguito
Vilela, em 2009 e 2012, onde atuou como arquiteta na Secretaria do Meio
Ambiente de Aparecida de Goiânia (SEMMA).
Além disso, sua atuação como
conselheira do CAU/GO é marcante, com contribuições importantes para as
políticas públicas dos conselhos municipais COMPUR e do Conselho Municipal de
Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de Goiânia.
E diante dos grandes desafios com que Goiânia, uma das capitais mais jovens em cenário nacional se depara em tempos atuais, a professora Maria Ester nos apresenta nesta entrevista uma sólida visão das necessidades mais urgentes em políticas públicas que visam sanar e/ou minimizar as inúmeras demandas que emergem em nosso território, o que depende em muito de uma boa vontade política e o compromisso público em combate às desigualdades que permeiam a cidade.
Dinalva Heloiza: - Maria
Ester, em uma reportagem publicado no caderno Magazine de O Popular – antes das
eleições - você mencionou a importância de uma gestão responsável que elabore
projetos alinhados com a preservação do Patrimônio Histórico de Goiânia, em
áreas do Art Déco. Quais seriam, na sua opinião, as intervenções mais urgentes
que a cidade necessitaria em relação a estes espaços, para que sejam preservados
de forma eficaz e não apenas “maquiado”?
Maria Ester – Em primeiro lugar se estamos falando de
gestão responsável e com projetos de preservação, devemos ter uma pasta (na
Secretaria de Cultura) na prefeitura que tenha orçamento para tais projetos. A
preservação nada mais é que um conjunto de medidas que monitorem, avaliem e
planeje obras que visem manter as edificações tombadas (ou não) com suas
características originais. A “eficácia” de uma intervenção do tipo restauração
para preservação é diretamente proporcional a qualidade dos projetos e
tecnologias empregadas (vide atualmente a reconstrução da Catedral de Notre-Dame
de Paris). O que chamamos de maquiagem, ou seja, intervenções de fachada,
pinturas superficiais, podem até prejudicar o futuro de monumentos e
edificações históricas e é uma pratica que deve ser condenada. Penso que já
passa a hora de gestores serem responsabilizados criminalmente pela destruição
da paisagem histórica.
O que considero uma intervenção urgente é o investimento no edifício do
Grande Hotel. Lembro que ele não está isolado da via, da viela e do seu
entorno, portanto um projeto que vise olhar para o conjunto do patrimônio no
Centro da cidade que inclua suas ruas e, principalmente, a Avenida Goiás também
me parece urgente.
Dinalva Heloiza - A
preservação do Patrimônio Histórico e Cultural, também se reflete na identidade
da cidade. Como você vê a relação entre a população goianiense e os espaços
urbanos históricos? Quais estratégias você sugere para fortalecer essa
identificação da população com o patrimônio da cidade?
Maria Ester – Por ser cidade projetada no século 20, e estar situada no Centro-Oeste brasileiro, nossa identidade ainda está por ser construída. É como se estivéssemos na infância da urbanidade. Quem nasceu em Goiânia tem aproximadamente 70 anos e os filhos de seus filhos provavelmente não tiveram aula de História de Goiás nas escolas. Entendo que desenvolvemos identidade a partir de uma relação forte com nossa história e é dever do Estado imprimir essa informação (nossa história) de forma clara, imparcial e sistemática.
Dito isso justifico minha observação de que a população goianiense não
desenvolveu ainda uma relação forte o suficiente com o espaço urbano em que
vivem, que poderiam (ou deveriam) imprimir uma identificação com esse lugar. O
que aprendemos na escola e que nos remete a ideia de patrimônio histórico
sempre está relacionado a espaços construídos antes do século 20, arquiteturas
com ornamentos em ouro, palácios, igrejas monumentais. Nosso Centro histórico é
desenhado com a perspectiva da modernidade, linhas retas e no máximo alguns
poucos elementos Art Decó. Isso (construções modernas) aos olhos do cidadão
comum pode não ter valor de preservação.
Temos ainda que quando o cidadão comum é o responsável pela gestão
urbana, permite que a cidade seja constantemente demolida e reconstruída, sem
considerar o desenho urbano e as edificações levantadas no início do surgimento
da cidade. O exemplo mais claro é a intervenção do BRT no centro histórico, que
descaracterizou totalmente a praça cívica e seus edifícios estão encobertos por
plataformas de embarque. Poderia ser diferente.
Sugiro, para fortalecer essa identificação em gerações futuras, um
conteúdo de arquitetura moderna nas escolas e a história de Goiânia nesse contexto,
sendo aplicado diariamente durante todo ensino fundamental. Podemos ter também
treinamento para o serviço público (vereadores, servidores, executivo, ...)
sobre o tema. Não temos museus que contem a história da cidade, filmes,
revistas ou material de fácil acesso que faça chegar à população esse conteúdo.
Sem educação de qualidade não teremos história para contar, nem a partir da
paisagem desconstruída da cidade.
Dinalva Heloiza - A
especulação imobiliária tem sido apontada como um dos maiores desafios para Goiânia,
principalmente pelos impactos de custos da moradia e na expansão desordenada. Em
sua perspectiva quais as ações mais urgentes, o novo prefeito deve tomar para
combater esse problema?
Maria Ester – Combater o problema da especulação imobiliária
requer um tipo de visão de mundo e de cidade que os gestores atuais, e
anteriores a estes, estão longe de atingir. Portanto combater o problema passa
por mudar o modelo de gestão urbana, o ideal de cidade que os gestores imprimem
em suas ações. Especular sobre a terra urbana só é possível com a anuência do
poder público, seja ele o executivo, legislativo ou o judiciário. Isso quer
dizer que os poderes sabem o que precisa ser feito, mas se organizam em
associação com o mercado de imóveis e a indústria da construção civil,
formatando uma cidade cuja pauta principal é fazer lucro. A visão de mundo de
que tudo está à venda na cidade, inclusive espaços públicos e áreas verdes de
proteção tem sido a tônica desde sua fundação.
Existe mais de um instrumento de política urbana capaz de conter a
especulação e a desigualdade de acesso à terra urbana, mas é preciso que os
poderes se empenhem em cumprir a lei. São instrumentos: o IPTU progressivo, o
parcelamento e/ou uso compulsório de glebas não urbanizadas na cidade,
desapropriação, regularização fundiária, concessão de direito real de uso,
instalação de áreas especiais de interesse social. Não são utilizados pelas
gestões anteriores e provavelmente a atual não irá se utilizar, uma vez que
representam a democratização do acesso à terra e uma melhor distribuição dos
espaços para habitação na cidade.
Dinalva Heloiza - A
expansão sem controle na cidade tem gerado impactos negativos no meio ambiente
e na qualidade de vida da população. Quais intervenções políticas, você crê poderiam
equilibrar o desenvolvimento urbano com a sustentabilidade ambiental?
Maria Ester – Intervenções políticas no meu entendimento
acontecem nas eleições e temos eleito negacionistas climáticos. Para equilibrar
a questão ambiental e urbana seria preciso olhar para a urbanização como algo
diferente do que se faz há cerca de 100 anos. Quando o modelo de cidade que
vivemos começou a ser construído, os espaços naturais (rios, matas ciliares,
florestas, morros, pântanos...) eram considerados elementos que atrapalhavam a
cidade. Hoje, mesmo com eventos climáticos destruindo cidades inteiras, o
negacionismo atrasa decisões que já deveriam ter sido tomadas desde décadas
atrás, portanto uma intervenção será o bombardeamento de informações
científicas sobre o tema.
O exemplo mais claro é o de ocupação de áreas de inundação de córregos e
rios. Todos sabemos que não é adequado ocupar esses espaços, entretanto a
própria câmara de vereadores de Goiânia aprovou projeto de lei (plano Diretor de
2022) autorizando a ocupação dessas áreas. O mesmo se vê com relação à expansão
urbana, esse mesmo plano autoriza a transformação de áreas rurais em áreas
urbanas para ocupação, sem critérios claros sobre os índices urbanísticos de
preservação ambiental. A intervenção precisa ser de caráter educacional,
convencendo os legisladores de que os danos causados por suas propostas podem
ser irreversíveis. Há também que se imprimir regras mais rígidas sobre os
crimes ambientais cometidos por esses legisladores. Não vemos políticos sendo
presos por autorizarem desmatamento ou ocupação em áreas improprias.
Dinalva Heloiza - Questões
que envolvem a mobilidade urbana é um tema recorrente em grandes cidades, e em
Goiânia, um grande desafio, com um trânsito cada vez mais caótico e a
infraestrutura inadequada, agravam esse cenário. Que tipo de intervenções você
vê como essencial nesse contexto em Goiânia, visto ser uma grande metrópole com
larga expansão demográfica?
Maria Ester – Penso que não há como pensar em intervenções
que não sejam distribuídas em: medidas de urgência, médio e longo prazo. De
urgência, a cidade precisa ser sinalizada e demarcada para o pedestre, ou seja,
faixas de travessia no piso, botoeiras, sinalização tátil e sonora para pessoas
com problemas auditivos e uma completa requalificação de calçadas, que penso
ser obrigação da gestão pública fazer.
Para resultados em médio prazo, aumentar linhas de ônibus, aumentar
número de ônibus para os usuários, transformar os pontos de ônibus em espaços
tecnológicos, sustentáveis e agradáveis. Transformar os espaços de
estacionamento ao longo das vias da cidade em espaços pagos, para que esse
recurso se reverta em investimentos em mobilidade. Imprimir a obrigatoriedade
de velocidade 30,0 km/h em todas as vias locais da cidade (as internas aos
bairros). Integrar os programas de gestão das pastas de educação e de saúde com
programas de mobilidade com intuito de reduzir o número de mortes no trânsito.
Em longo prazo é necessário que tenhamos a vontade de mudar a cultura de
que o carro é nossa única e melhor forma de deslocamento. Andar a pé pode
começar a ser divulgado, ensinado mesmo, como sendo uma das melhores práticas
de mobilidade, pois afetam nossa saúde positivamente. Acontece que para isso a
estrutura da cidade precisa mudar antes: calçadas acessíveis, distâncias de
centros de serviços menores, mais arborização para sombrear os espaços de
caminhada, ou seja, a longo prazo a cidade precisa ser reconstruída para o
pedestre e assim melhorar as condições de mobilidade. Em segundo lugar e com
uma estrutura melhorada para andar de ônibus, em longo prazo, a população
começar a perceber que o veículo individual não é a única opção de conforto em
deslocamento. Eu sou usuária do transporte coletivo mas por pura opção, quase
uma excentricidade e realmente é sofrível. Os Ónibus são velhos, barulhentos,
inseguros e são poucas as opões de linhas.
Enfim, o caos que vemos no trânsito, e que é problema de veículos
individuais e seus motoristas, não findará se não educarmos a população para
que as relações urbanas sejam mais civilizadas. Sempre haverá congestionamento
quando toda população que trabalha se deslocar para casa e vice-versa,
simultaneamente. O que pode melhorar essa situação é aceitar e cumprir as
regras do código de trânsito, coisa que por aqui não é comum. A questão da
mobilidade é complexa pois envolve cultura (comportamento), educação, saúde,
urbanização, tecnologia e todos precisam estar com a mesma intenção na gestão.
Dinalva Heloiza - Goiânia já
enfrenta desafios significativos relacionados à gestão das águas, como a
poluição de recursos hídricos e mesmo escassez em algumas épocas. O que o novo
prefeito municipal, em sua opinião, pode fazer para implementar uma gestão eficiente
dos recursos hídricos e garantir que as futuras gerações tenham acesso a água
limpa e potável?
Maria Ester – O município de Goiânia é bem abastecido por água tratada em seus domicílios conforme publicação dos institutos de pesquisa. Para as futuras gerações os investimentos devem ser principalmente na manutenção dos ribeirões de abastecimento (suas nascentes e áreas de recarga). Nossa bacia de retenção do Ribeirão João Leite precisa também ser protegida da ocupação desordenada por chacareiros e possiblidades de abertura de usos recreativos.
Outra medida que garante recursos hídricos no futuro é a criação de
consórcios entre municípios da Região metropolitana para uma equilibrada
distribuição de água tratada para as cidades. A natureza não divide territórios
mas nós urbanos sim, por isso é possível que no futuro cidades precisem comprar
água de outros municípios, o que sem planejamento pode gerar conflitos e
problemas desnecessários surjam. Os eventos climáticos extremos recentes
indicam que o desabastecimento será nossa crise climática. Soluções como preservação
de água em bacias, proteção de áreas úmidas, proteção de nascentes, conservação
de áreas de proteção permanente em áreas urbanas e rurais, cultivo de florestas
urbanas, implementação de arborização urbana para equilíbrio do ecossistema
urbano, cuidado com a expansão das áreas urbanas sobre as rurais, mas, principalmente,
o combate ao desmatamento da floresta amazônica que nos dá as chuvas, são
algumas medidas.
A despoluição desses mesmos ribeirões é medida urgente também, pois a
vitalidade e saúde deles dependerá a nossa.
Dinalva Heloiza - O
desenvolvimento sustentável tem sido uma agenda importante para muitas cidades
ao redor do mundo. Quais políticas públicas você considera essenciais para que
Goiânia se torne um exemplo em sustentabilidade ambiental, considerando o uso
eficiente dos recursos naturais e o controle da poluição tanto por despejos e
descartes, quanto por emissões?
Maria Ester – A expressão desenvolvimento sustentável é
complexa o suficiente para que a resposta também seja.
Entendo que sustentabilidade é um tema diretamente relacionado à cultura
do consumo, portanto para pensarmos em políticas públicas essenciais para que a
cidade seja exemplo de sustentabilidade, devemos começar por políticas de
educação de combate ao consumo de descartáveis, ao consumo exacerbado de
plásticos, consumo e descarte exacerbado de roupas, calçados e bolsas (Goiânia
é um dos maiores produtores desses produtos no país) e fazer isso sem
desequilibrar a economia no município.
Para isso é preciso defender políticas públicas de uso de materiais
reciclados, materiais que possam ser reciclados, uso de energia limpa... coisas
que já sabemos que temos que fazer.
Goiânia é classificada como uma das cidades que mais constrói, que mais
vende apartamento e que mais expande sua área urbana para cima da área rural.
Esses três fatores são o avesso do caminho da sustentabilidade. Por isso a
complexidade da questão. A indústria que mais se utiliza de recursos naturais é
a indústria da construção civil e tem em Goiânia território livre para atuar,
sem exigência de tratamento de resíduo, sem programa de tratamento de resíduo,
sem ao menos pactuar com essa indústria, alguma ação que minimize os impactos
da atividade. Não temos indústria que beneficie os resíduos dessa mesma
atividade em prol da economia de uso dos recursos naturais. A água é um deles,
então teremos que pautar uma cultura (mais uma vez) de uso dos recursos com base
na ideia de consumo.
Quantas indústrias de concreto possuem reserva de água das chuvas para
uso futuro? Quantos canteiros de obras ensinam seus trabalhadores a não fazer
uso de plásticos e descartáveis? Penso que é por aqui que devemos começar.
Dinalva Heloiza - Goiânia é
uma das cidades mais desiguais do Brasil, o que reflete diretamente nas
condições de vida de muitos de seus moradores. Quais estratégias você sugere
para que o novo governo enfrente esse problema e promova um maior equilíbrio
social e econômico na cidade?
Maria Ester – O tema do direito à cidade é o caminho da
resposta aqui. O equilíbrio social e econômico será atingido quando a população
tiver igual acesso aos serviços urbanos básicos. A moradia é o primeiro dos
direitos. Em seguida o acesso à escola, ao tratamento de saúde, ao transporte
digno, ao emprego, ao espaço público e ao lazer. Uma primeira estratégia a meu
ver é mapear a desigualdade e mostra-la geograficamente. Em seguida investir em
serviços urbanos nas áreas mapeadas.
Reduzir a desigualdade passa, a meu ver, pela redução da concentração de
riqueza na cidade. Em Goiânia isso é visível e não seria tão complexo
redistribuir a riqueza de urbanização se desse a mesma atenção de obras
públicas na região norte, nordeste, que se dá à região sul e sudeste. Passa
também por repensar o modelo econômico e de gestão que se imprime. Qual o
tamanho e importância de uma Secretaria de Assistência Social comparada à
Secretaria de Mobilidade? Ultimamente carros tem tido atenção e muita energia é
dispendida para solução dos espaços para eles. O mesmo não se vê com relação a
pessoas em situação de vulnerabilidade. Uma estratégia seria mudar os pesos
dessa balança e dar muita atenção e energia a quem realmente precisa.
Dinalva Heloiza - O direito
à cidade e o acesso a oportunidades de bem-estar urbano são essenciais para a
população. Como a gestão pública pode garantir que todos, principalmente as
populações mais vulneráveis, tenham acesso a uma cidade mais justa e inclusiva?
Maria Ester – Como continuidade da resposta anterior, ações
que tragam para a pauta os mais vulneráveis serão ações que trarão as
oportunidades. As leis necessárias para garantir os direitos das pessoas já
existem, inclusive desde 1988. Portanto fazer valer as leis de assistência
social, leis de regularização fundiária, de proteção dos idosos e pessoas com
deficiência mudará o cenário de quem precisa do apoio do estado para ter bem
estar. A gestão pública tem os recursos, não falta dinheiro, mas precisa escolher
usar nessa pauta.
Dinalva Heloiza - A
participação cidadã é fundamental para a construção de políticas públicas mais
eficazes e democráticas. Como você acredita que o novo prefeito pode incentivar
a participação ativa da população nas decisões sobre o futuro de Goiânia?
Maria Ester – Se o novo prefeito chamar a população vai
atender, isso é uma certeza que tenho. Mas o chamamento é uma atitude de gestor
com outra visão da coisa pública. Neste momento temos um gestor que diz saber o
que tem que fazer, o que me parece que ele não precisa ouvir o que a população
tem a dizer. Um exemplo disso é a convocação para a Conferência Municipal de
Goiânia que está longe de ser importante na gestão. A participação da sociedade
civil na conferência é o que enriquece e traz muita luz para solução de
problemas comuns na cidade, mas não veremos o chamamento acontecer senão sob
forte pressão de entidades e do governo federal, maior interessado.
Dinalva Heloiza - O
conceito de governança urbana envolve não apenas a gestão pública, mas também a
interação entre o governo, a cidadania e o setor privado. Que tipo de
estratégias de governança você considera fundamentais para uma gestão mais
transparente e eficiente em Goiânia?
Maria Ester – A estratégia é justamente a transparência.
Uma cidade como Goiânia tem que se valer da lei que permite a formulação de
consórcios municipais, parcerias com setor privado, mas com muita transparência
e de preferência excluindo parentes de gestores dos contratos. Há que se
implementar estratégias de monitoramento dessas parcerias e analisar
indicadores de melhorias, ou não, nos serviços oferecidos pelos contratos.
Também importante pensar em despolitizar a governança e profissionalizar o que
se pretende executar de projeto em âmbito regional ou mesmo local.
Dinalva Heloiza - Goiânia
tem experimentado uma dinâmica de metropolização, que envolve um crescimento
acelerado da região metropolitana. Como você vê os desafios dessa expansão para
o planejamento urbano da cidade, e quais soluções você sugere para uma
metropolização mais equilibrada?
Maria Ester – Esta é uma questão que cabe num livro, tem
muita complexidade e muito temas transversais que indicam soluções. O desafio a
meu ver é político, mais uma vez.
A metropolização equilibrada sugere uma gestão metropolitana equilibrada.
No caso da RMG nem a temos. O CODEMETRO não tem se reunido desde a primeira
gestão do governo Caiado em 2018. Um plano metropolitano foi contratado e
sequer isso é pautado no governo estadual pois a secretaria responsável foi
eliminada à época (2018) e hoje a gestão do plano é fragmentada. São 20
municípios, sendo 3 conurbados com Goiânia (Senador Canedo, Trindade, Aparecida
de Goiânia) que não conversam entre si sobre as questões básicas como
mobilidade, resíduo, abastecimento de água, preservação do meio ambiente. O
equilíbrio deve começar pelo diálogo, pela ação de se reunir para falar sobre o
futuro desse aglomerado.
Dinalva Heloiza - Como
professora e especialista em urbanismo e paisagismo, qual o papel da academia e
da pesquisa na construção de soluções inovadoras para os desafios urbanos de
Goiânia? O que pode ser feito para aproximar ainda mais o conhecimento
acadêmico das ações públicas na cidade?
Maria Ester – A meu ver é a academia que produz as soluções
para problemas humanos, não somente urbanos. Vacinas, roupas tecnológicas,
aparelhos para pessoas com deficiência, pavimentos drenantes, todas essas
coisas são desenvolvidas dentro de universidades, com conhecimento científico,
portanto não há outro local para produção de conhecimento e tecnologia senão
dentro da academia. Para aproximar esse conhecimento das ações deve haver mais
interesse de ambas as partes em se conectar e transformar o conhecimento em
ação.
A resistência de ambas as partes se dá, a meu ver, por motivos
diferentes. Na academia não há muito tempo para o debate e vemos uma crescente
defesa do ensino à distância, o que enfraquece muito as relações. As
remunerações também são baixas para uma maioria e o trabalho é pesado para
somar nas atividades essas ações extraclasse. Do lado da gestão percebo a mesma
fórmula de sempre, que politiza os setores técnicos e não abre muito espaço
para convênios, experiências em grupo, oficinas de treinamento e testes de
modelos... isso dá trabalho e gestões eminentemente políticas não tem interesse
nisso.
Para uma aproximação, os dois tem que querer.
Dinalva Heloiza - Para
encerrar, quais suas expectativas em relação à nova gestão municipal de
Goiânia? Há algo que gostaria de ver implementado já no primeiro ano desse
governo, para que Goiânia tenha um começo de transformação em direção a um
futuro mais sustentável, inclusivo e moderno?
Maria Ester – Não tenho expectativas de que será uma gestão
diferente da anterior em termos de visão de mundo, visão de gestão pública e
política. Mudaram os atores de um primeiro escalão, mas a maioria dos
vereadores permanece na câmara e as trocas e contratações para a gestão seguem
no mesmo ritmo de décadas de gestão. Poderíamos ver implantado o plano de
arborização aprovado e que pode ajudar em muito o futuro do ambiente urbano.
Ver o plano de drenagem concluído e efetivado também seria muito bom.
Temos leis para mobilidade, usos e atividades econômicas, lei de
Habitação Social, plano diretor, mas elas foram modificadas para o
favorecimento da indústria da construção civil. Mudar algumas estruturas nessas
leis seria uma coisa muito importante também, mas não tenho expectativa de que
esse modelo de gestão o faria.
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