Brasil ignora recomendações de relatora independente da ONU nos preparativos da Copa e Olimpíadas.
Em maio de 2012 o Governo brasileiro completará um ano de paralisia diante de compromissos anunciados à Relatora Independente das Nações Unidas sobre o Direito a Moradia Adequada, a brasileira Raquel Rolnik, no âmbito do reassentamento de famílias por conta dos preparativos para a Copa do Mundo e as Olimpíadas. A Relatora alerta que não existem informações públicas disponíveis sobre o número de remoções e que faltam ainda projetos, critérios e consulta às comunidades afetadas.
“Não sabemos até hoje quantas pessoas serão removidas, para onde elas serão levadas, aonde estão esses projetos. Nada disso existe disponível nem no Rio de Janeiro e em nenhuma das 12 cidades-copa, até porque boa parte dos projetos nem existem”, disse a Relatora Especial na quinta-feira (19/04) durante o lançamento do Dossiê Megaeventos e Violações dos Direitos Humanos no Rio de Janeiro, produzido pelo Comitê Popular Rio Copa & Olimpíadas. No documento, a sociedade civil estima que 7.185 famílias já foram removidas ou estão ameaçadas de remoção na cidade do Rio de Janeiro em 2011.
Durante o evento, Rolnik lembrou que em maio de 2011, em carta resposta, o Governo brasileiro havia se comprometido a criar um Grupo de Trabalho para acompanhar o processo das remoções e também um protocolo federativo sobre esse tema. De acordo com Rolnik, nada foi cumprido.
“O que é urgente, urgentíssimo, para ontem no âmbito do governo brasileiro é estabelecer um protocolo relativo às remoções. Ele deve ser um protocolo federativo, firmado pelo governo federal, os governos estaduais e os municipais envolvidos, que estabeleça claramente um compromisso com as remoções de acordo com a legislação internacional e com a legislação brasileira sobre esse tema.”
Direito a posse sob ameaça
Apesar de o país ter assinado uma resolução do Conselho de Direitos Humanos da ONU específica sobre o direito à moradia adequada no contexto dos megaeventos e dispor de uma constituição avançada sobre o tema, para Rolnik é a mobilização da sociedade civil que tem garantido alguns avanços práticos. “Por exemplo: o Rio de Janeiro mudou o decreto que estabelecia como teto máximo de compensação 40 mil reais para 80 mil reais, isso foi fruto dessa mobilização; parou de fazer remoção com a subprefeitura e envolveu a secretaria de habitação, o que mudou muito a postura”
Além das violações no decorrer do processo de remoção, Rolnik descreveu também um segundo tipo relacionada ao direito dos posseiros. “A maioria das remoções são dos assentamentos informais, muitos deles com direito a terra por conta da legislação nacional e internacional. (…) Há remoções sem justificativa nenhuma como no entorno do Itaquerão (estádio de futebol) na zona leste de São Paulo, e também da Vila Autódromo (no Rio de Janeiro), a não ser um processo de expropriação daquele território para o capital”.
Ela observou que projetos de desenvolvimento econômico, em especial nas áreas de mineração, ferrovia e portos industriais, também têm contribuído para retroceder o direito a posse no país. Ela pediu maior compromisso do Judiciário, Executivo, Legislativo, dos meios de comunicação e do empresariado para garantir o direto humano a moradia, independentemente da condição de posse.
“O reassentamento tem que garantir a moradia adequada. Não é admissível que uma pessoa vá para uma condição pior do que se encontrava, da casa à inserção urbana, do que isso significa como ser cidadão”, concluiu.
Raquel Rolnik informou ter sido procurada pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) para apresentar denúncias de violações sobre o direito a moradia. A reunião ainda não tem data definida.
Publicado Originalmente em UNICRio