Dinalva Heloiza
Em 2025, o Brasil sente com intensidade os efeitos de uma das decisões mais controversas do governo Bolsonaro: a aprovação da autonomia do Banco Central, sacramentada pela Lei Complementar 179/2021. Sob o argumento de blindar a política monetária de interferências político-partidárias, o Congresso Nacional entregou ao sistema financeiro nacional um cheque em branco que, hoje, tem custado caro à economia, à democracia e à sociedade brasileira como um todo.
O modelo adotado, promovido por
Paulo Guedes e articulado nos bastidores com apoio de Bolsonaro e Arthur Lira,
garantiu ao BC independência formal e operacional, mas sem os devidos
mecanismos de controle social, transparência e responsabilidade fiscal.
Resultado: um Banco Central que, ao invés de servir ao povo e à estabilidade
macroeconômica, passou a operar de forma opaca, favorecendo deliberadamente os
interesses dos grandes bancos — inclusive remunerando suas sobras de caixa com
recursos públicos.
O Brasil como refém do rentismo
A taxa Selic em 14,25% ao ano,
anunciada em março de 2025, além de ser o 5º aumento em 2025, é mais do que um número elevado — é uma sentença.
Pequenas e microempresas, que são o coração da geração de empregos no país,
estão sucumbindo diante do custo proibitivo do crédito. A alta dos juros, longe
de conter uma inflação que é majoritariamente impulsionada por preços
administrados e choques externos, tem servido apenas para garantir lucros
recordes ao setor bancário — justamente o segmento que o Banco Central deveria
fiscalizar.
Estamos diante de uma armadilha
institucional: o Banco Central tornou-se um órgão técnico capturado, com carta
branca para transferir riqueza pública ao setor privado, ao mesmo tempo em que
compromete os esforços do governo federal para reaquecer a economia e investir
em políticas públicas.
A crítica que foi ignorada
À época da aprovação do PLP
19/2019, diversas vozes alertaram para os riscos da proposta. Organizações como
a Auditoria Cidadã da Dívida, entidades de magistrados e procuradores da
Fazenda, e especialistas como Jessé Souza e Maria Lucia Fattorelli denunciaram
o golpe institucional disfarçado de modernização.
Fattorelli, com precisão
cirúrgica, expôs o verdadeiro jogo por trás da autonomia: consolidar a política
do “Bolsa-Banqueiro”, com remuneração diária às instituições financeiras por
valores parados, enquanto a população padece sem acesso ao crédito, ao emprego
e à renda. As operações compromissadas, que já representam quase um quarto do
PIB, evidenciam a gravidade dessa distorção. E pior: todos os prejuízos do BC
são socializados — pagos pelo Tesouro Nacional, ou seja, por nós, a sociedade.
A crise de hoje nasceu da
imposição de ontem
A pandemia foi usada como escudo
para evitar o debate público. Sem audiências, sem consulta às universidades,
sem participação social, a proposta foi aprovada no Congresso com ampla
maioria, apesar da sua ilegalidade de origem — uma vez que contrariava o artigo
61 da Constituição, que atribui ao presidente da República a iniciativa
exclusiva para esse tipo de projeto.
E agora, colhemos os frutos de
uma política que transfere bilhões aos bancos enquanto o Estado se vê de mãos
atadas para impulsionar o crescimento. O Banco Central, que deveria ser parte
da engrenagem do desenvolvimento, atua como freio monetário a serviço de uma
minoria que lucra com a estagnação.
Soberania econômica como pauta
urgente
O que vemos em 2025 é o resultado
de uma arquitetura institucional que consolidou o domínio do sistema financeiro
sobre as decisões de política monetária e cambial. É urgente resgatar o debate
sobre o papel do Banco Central na construção de uma economia soberana,
inclusiva e transparente.
A autonomia que se consolidou
foi, na verdade, uma subordinação aos interesses de poucos — às custas da
maioria. É tempo de reconstruir o país, e isso passa por rever as estruturas de
poder que hoje aprisionam nosso desenvolvimento.
E voilá que esse pais acorde, para o que está em jogo e em andamento numa surdina absurda!
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