Novos modelos de ocupação urbana
A saudável dinâmica do setor imobiliário fez ressaltar um problema endêmico: a falta de planejamento urbano e de uma visão mais sustentável no funcionamento das cidades.
Por Claudio Bernardes*
Durante anos, o Secovi-SP empenhou-se na busca de soluções para dois problemas cruciais no âmbito da habitação: a ausência de financiamentos - em volume, prazo e taxa de juros condizentes com o bolso da população -, e de uma política efetiva para o atendimento das famílias de menor renda, incluindo condições especiais de pagamento e, principalmente, subsídios diretos.
Após quase duas décadas de estagnação, o mercado finalmente voltou a operar. A partir de 2004, novo marco regulatório para o crédito imobiliário possibilitou aos bancos retomar os financiamentos. Inclusive, surgiu entre eles uma saudável concorrência, hoje refletida em taxas de juros diferenciadas e empréstimos com prazos de até 30 anos.
No tocante à habitação de interesse social, foi criado o programa federal Minha Casa, Minha Vida, cuja tendência é se tornar uma política permanente, compartilhada pelos governos estaduais e municipais, e aperfeiçoada ao longo do tempo, haja vista dificuldades enfrentadas em grandes centros urbanos, como escassez de terrenos e preços proibitivos.
Nessas duas áreas, os avanços foram concretos. E, embora ainda tenhamos muito a fazer para eliminar o deficit de mais de seis milhões de unidades, os fundamentos estão criados.
Assim, a questão que agora desponta com maior evidência é: que cidades estamos produzindo e, mais ainda, como podemos melhorar aquelas já consolidadas?
A saudável dinâmica do setor imobiliário fez ressaltar um problema endêmico: a falta de planejamento urbano e de uma visão mais sustentável no funcionamento das cidades, que crescem sem o adequado controle, encostando umas nas outras, configurando megametrópoles.
Em função disso, e especialmente nos grandes centros urbanos, as pessoas perdem em qualidade de vida. A mobilidade é caótica. O cidadão mora num extremo da cidade e trabalha no outro. A poluição é crescente e o acesso a equipamentos públicos cada vez mais dificultado.
Por essa razão, o Secovi-SP defende a adoção de novos modelos de ocupação urbana, mais racionais e sustentáveis; mais inteligentes e eficazes. Isso implica derrubar mitos, como aqueles que, sem base técnica, condenam o adensamento, como se fosse natural empurrar as famílias de menor renda para os extremos da cidade e deixar subutilizada a infraestrutura instalada, obrigando o poder público a despender vultosos recursos sem razão objetiva.
É possível realizar o adensamento responsável. Temos tecnologias e sistemas capazes de fazer a sinergia com o meio ambiente, a responsabilidade social e a preservação histórica e cultural. Aliás, temos condições de resgatar espaços urbanos, reordená-los, descontaminar terrenos e devolvê-los às cidades, recuperar bairros degradados, ressuscitar mananciais.
Nesse sentido, há que se desenvolver todo um trabalho técnico, a ser amplamente debatido com a sociedade, em permanentes diálogos urbanos, e consoantes com projetos que já estão em discussão, pois a proposta é convergir, não dividir.
Existem estudos e projetos para apoiar esse trabalho. O Secovi-SP, por exemplo, elaborou com a Fundação Dom Cabral, Indicadores de Sustentabilidade no Desenvolvimento Imobiliário Urbano - um conjunto de princípios que serve para orientar o planejamento e o reordenamento das cidades para torná-las mais humanas e eficientes.
Também estamos contribuindo com o "SP 2040", um plano de longo prazo que pretende orientar uma ampla transformação da Capital nas próximas décadas, apontando para formas de organização social, econômica, urbana e ambiental que assegurem o uso inteligente dos seus recursos e promovam melhores condições de vida.
Aliás, cabe ressaltar que esse plano, no que se refere ao eixo estratégico "Desenvolvimento Urbano", tem por premissa exatamente o que defendemos com vistas à sustentabilidade: cidades compactas, onde pessoas morem perto dos locais de trabalho, educação e diversão.
Muitos podem pensar que 2040 é longe demais. Mas garantir às futuras gerações condições de vida iguais ou melhores das que usufruímos é a base do pensar sustentável.
Estamos diante de grande processo que exigirá muita vontade política. Uma vontade que não depende só de políticos. Uma vontade que tem de ser de todos nós.
* Presidente do Secovi-SP, do Sindicato da Habitação, e reitor da Universidade Secovi
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